Pessoas com gostos, idades e costumes distintos vivem em condomínios e síndicos têm que administrar a boa convivência entre os diferentes perfis
A vida em condomínio reflete a diversidade da sociedade: pessoas de diferentes personalidades que precisam aprender a conviver civilizadamente, apesar das diferenças Em condomínio a diversidade de pessoas com personalidades e estilos de vida diferentes, ligadas apenas pelo fato de dividirem um lugar parcialmente coletivo e em parte privado, muitas vezes é vista somente como geradora de conflitos. São pessoas de idades, costumes, gostos, trabalhos, necessidades distintas. Porém, se o síndico souber identificar as particularidades de cada um e mostrá-las ao conjunto, poderá minimizar os impactos do que há de prejudicial nas diferenças e tirar proveito das benevolências para melhorar a convivência e a administração do condomínio. Cada morador tem sua particularidade, a psicologia comprova que as pessoas são únicas em seu existir. O Jornal dos Condomínios consultou especialistas de áreas ligadas à vida condominial, como administradores e advogados, além de uma psicóloga, para apontar os principais tipos de moradores e dar dicas de como solucionar os problemas ocasionados por seus temperamentos e como transformar essas dificuldades em virtudes. O baladeiro Qual o condomínio que não tem pelo menos um morador que gosta de oferecer festas para os amigos regularmente? Alguns não escolhem dia, nem hora. São capazes de chamar os colegas para uma cervejinha e ouvir um som em seu apartamento em plena segunda-feira. São os famosos baladeiros. Geralmente são pessoas descontraídas e mais jovens, que gostam de ter uma vida social agitada. Se para o baladeiro a festinha no apartamento é apenas um momento de diversão, para os vizinhos pode ser uma tortura, se o barulho expandir para dentro das unidades alheias. Ainda mais em tempos de pandemia onde a aglomeração de pessoas não é permitida e pode colocar em risco a saúde dos outros moradores. Solução É preciso diferenciar. Se a pessoa está de aniversário e realiza um jantar com quatro, cinco pessoas em sua residência, é um momento especial e pode ser tolerado. Já aquele que todas as noites traz amigos e coloca música alta caracteriza-se como um excesso que deve ser coibido. Na tarefa de conter o exagero dos barulhentos, a psicóloga Letícia Delpizzo defende que o diálogo é a melhor maneira de gerar a transformação de comportamento ao invés de gerar uma multa diretamente. Conversar: “Sabia que seu vizinho tem que acordar cedo no outro dia, tem crianças e esse barulho interfere na vida dele, além de trazer um risco a saúde dos moradores?”, sugere Delpizzo. Ela observa que expor as regras é diferente do que agir severamente, pois o morador se sentirá respeitado e mais facilmente buscará considerar o resultado de suas atitudes para seus vizinhos. Porém, se não adiantar, para a sócia e advogada da Plac Planejamento Assessoria de Condomínios, Dirlei Magro, o síndico deve respeitar o regimento e providenciar que seja aplicada a advertência ou multa. O fofoqueiro Um dos perfis de condômino que mais causa problemas no edifício é o fofoqueiro. Ele sempre está de olhos abertos para o que ocorre na vida alheia e repassa as informações, sem cunho verídico, aos funcionários, vizinhos e síndico. As ações desse tipo de morador geram discórdia entre os residentes e até entre os funcionários e administração do prédio e pode causar danos a uma pessoa injustamente. De acordo com especialistas em comportamento humano, o fofoqueiro é aquele que fala ‘pelas costas e depois diz que nada fez’. Solução Não há fofoqueiro se não tiver quem o escute e o melhor a se fazer é não tomar partido. É importante procurar saber a verdade das informações, apenas se o problema for afetar o condomínio. Se for a respeito da vida individual de um morador, o síndico deve se abster e não passar as informações aos outros condôminos. Se a fofoca passar dos limites pode até entrar na esfera judicial onde há previsão legal para aquele que causar dano a outra pessoa, inclusive de ordem moral. Portanto, o fofoqueiro deve pensar bem antes de acusar o síndico sem provas ou de atacar gratuitamente o seu vizinho. É preciso prestar atenção também nos trabalhadores: os funcionários são a ponte de comunicação entre os moradores e a administração e o filtro dessas informações é indispensável na vida do síndico. O implicante Aquele que questiona a administração em tudo, nada está bom, toda a decisão foi pautada de forma errônea, este é o condômino implicante. É a pedra no caminho do síndico objetivo, que gosta de realizar o trabalho com eficácia. Quando um assunto parece estar deliberado na assembleia, logo surge o implicante com inúmeros questionamentos, muitos dos quais desnecessários e que parece surgir apenas da busca por contrariar a decisão de todos. Solução O ideal é trazer o condômino para o lado da administração, com convites para fazer parte do conselho, das reuniões informais com a administração, solicitar que apresente soluções ou o seu ponto de vista sobre futuras decisões. A medida é sugerida pela psicóloga Letícia Delpizzo, que aponta o implicante como uma pessoa metódica, por isso é interessante chamá-lo para participar em funções de secretariado e tesouraria. Pode pedir para ajudar a fazer os balancetes. “É um tipo de tarefa que é importante ter uma pessoa deste perfil e que usará sua ‘chatice’ para algo que vai ajudar a todos”, recomenda. Também pode pedir para que faça as atas das reuniões, “assim ele não terá como criticar desprovidamente algo que ele mesmo fez”, explica. A família problema A família problema é aquela que vive em pé de guerra e os respingos das desavenças causam transtornos para os outros moradores. É muito desgastante se envolver em questões familiares, mas o síndico não pode se esquivar de chamar a atenção do morador quando seus entes começam a perturbar o sossego dos vizinhos com o barulho das discussões domésticas ou com comportamentos mais agressivos e descorteses na área comum do edifício. Solução A conversa é a medida mais interessante. A orientação é chamar o morador para uma conversa na administração para explicar a importância de respeitar os limites com os vizinhos e lembrá-lo de tomar conhecimento do que diz o Regimento Interno. A psicóloga Letícia ensina um truque para iniciar um diálogo com a família sem ser de forma agressiva, ao invés de apontar que estão incomodando. “Percebo uma certa agitação no seu apartamento. Vocês precisam de alguma ajuda?”, sugere o questionamento. Segundo ela, oferecer colaboração fará com que a pessoa se sinta acolhida e estará “dando uma indireta mostrando que todos já sabem que eles estão com problemas”, acrescenta. O louco por obra O louco por obra é aquela pessoa agitada que busca sempre modificar algo em casa. Essa mania chega a deixar os moradores preocupados com a possibilidade do proprietário mexer tanto que atinja a estrutura do prédio. Qualquer condômino tem o direito de fazer quantas reformar quiser em sua unidade, porém é preciso respeitar alguns critérios. O louco por obras nem sempre controla o impulso e é capaz de começar a martelar a parede em um sábado à tarde em que os moradores estão descansando. Solução De acordo com o advogado Alberto Calgaro, na convenção ou no regimento interno deve constar a limitação de horários e dias da semana, a necessidade ou não de comunicação prévia ao síndico e de apresentação de projetos de acordo com a NBR 16.280 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que trata da gestão de reformas em edificações. E principalmente deve ser alertado aos moradores que o artigo 1.336, do Código Civil, estabelece ser dever de todos não realizar obras que comprometam a segurança da edificação, como mexer nas colunas do prédio. Para a psicóloga Letícia Delpizzo, modificar fora pode ajudar a diminuir o interesse em alterar dentro do apartamento, por isso “pode-se convidar o louco por obra a participar de uma comissão de reforma ou decoração no prédio”, diz a psicóloga Letícia. O dono de animal problema As normas jurídicas não permitem que o condomínio proíba os moradores de ter animais, desde que não interfira no bem-estar do restante dos moradores do prédio. Mesmo assim, existem animais que latem a qualquer hora ou aqueles tutores de que não transportam seu pet de forma correta, às vezes, trazendo riscos para os outros. O dono de animal problema na verdade é o pivô das desavenças, já que é ele que não respeita as regras do edifício por não entender que existem pessoas que não têm a mesma afeição por animais. Solução Fazer reuniões com os donos de animais para esclarecer sobre a importância de seguir normas para a presença dos pets, como nas questões como o recolhimento de fezes, o barulho, o transporte no elevador ou mesmo ao deixar os animais circularem sozinhos nas áreas comuns do prédio. “É necessário disciplinar em regimento interno a forma de conviver com os animais no condomínio e distribuir circulares periódicas informando dessas normas – não havendo respeito, deve-se advertir e multar conforme determina o regimento interno”, diz a advogada Dirlei Magro. O ausente O morador ausente é aquele que, como diz o ditado popular, paga para não se incomodar. Segundo o proprietário da Omega, empresa de contabilidade condominial em Balneário Camboriú, Vitor Antônio Pinto, o ausente é aquele que não participa de nada ou até frequenta as assembleias, mas não opina, para ele tudo está bem. “Não critica nada. Só assina e vai embora”, mostra. Porém, se muitas pessoas no condomínio têm esse perfil, o síndico fica sobrecarregado de tarefas, que devem ter a colaboração de todos. Outro problema dos que nem aparecem nas reuniões é a falta de quórum para deliberar medidas importantes. Solução De acordo com Vitor, o ausente geralmente não aceita convites para algo que gere responsabilidades. Mas, a única forma de fazê-lo ser mais participativo é incentivá-lo a participar do corpo diretivo do condomínio. “Ele precisa saber que todas as pessoas tem suas obrigações”, lembra. O antissocial O condômino mais difícil de lidar é o antissocial. Ele não respeita as normas do condomínio, não respeita os vizinhos, funcionários e síndico. Segundo a advogada Dirlei Magro, é aquele popular “encrenqueiro” que prejudica os demais com barulho, maledicências, brigas com vizinhos ou outro tipo de prejuízo que torne insuportável a convivência entre vizinhos. Solução Neste caso as opiniões sobre a forma de desvencilhar são diversas. Alguns especialistas apontam que se não for um caso grave, o síndico pode tentar resolver os problemas de forma harmoniosa, com diálogo. Se não houver diálogo, uma advertência ou uma multa podem resolver o problema. A advogada Dirlei Magro aponta as saída legais contida no Art. 1337 do Código civil: o condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais. O mesmo artigo do Código Civil ainda traz solução para aquele morador que, por seu reiterado comportamento antissocial, gerar incompatibilidade de convivência com os demais moradores. “É possível convocar assembleia com pauta específica, onde poderá ser votada a aplicação de multa de até o décuplo do valor atribuído à contribuição mensal da taxa condominial”, explica. Além disso, em casos graves quando a convivência com os demais moradores se torna perigosa ou prejudicial à coletividade e quando demonstrado que todas as medidas legais colocadas à disposição do condomínio não surtiram o efeito almejado, é possível conseguir a expulsão do condômino antissocial, explica o advogado especialista em condomínios, Zulmar Koerich Junior.
Como lidar com as "panelinhas"
A formação de panelinhas (grupos fechados) é um fenômeno comportamental generalizado. Ocorre no ambiente escolar, no mundo do trabalho e é também recorrente nos condomínios. A existência desses grupos pode acarretar em prejuízos à vida numa comunidade condominial? Sim, segundo a longa experiência do professor Maurício Jovino, diretor do Centro de Capacitação de Síndicos, em alguns casos.
Afinidades e antipatias resultam em conflitos nos mais diversos graus. Até que ponto o síndico deve tolerar essas condutas? “Não há como evitar a formação de panelinhas nos condomínios. Mas o síndico deve procurar agir com a razão, inteligência, deixando de lado reações emocionais diante de eventuais ações ou ataques verbais de condôminos”, observa Jovino.
O professor, com mais de 3 mil alunos formados em seus cursos, afirma que o primeiro passo a ser dado pelo síndico é analisar e distinguir entre a chamada crítica construtiva e o puro deboche ou até “sabotagem”. Para Jovino, fica claro que quando alguém faz uma crítica ao valor da cota condominial, desempenho de funcionário, higiene do condomínio ou outro aspecto o mais importante é procurar rebater, mas rebater com argumentos consistentes. “Há muitos condôminos que reclamam com interesses próprios, relatando que conhecem fornecedores de serviços que fazem melhor e mais barato. No fundo, são interesses particulares.” É importante que o síndico promova enquetes, pensa Jovino. Assim, é possível captar a opinião do público condominial de forma mais precisa. “Se alguém estiver questionando o trabalho de um porteiro ou zelador, o síndico pode responder de imediato que tal funcionário é bem avaliado e que aquela é uma opinião isolada. Isso não significa ignorar a reclamação, mas contextualizá-la”, explica. Os aplicativos condominiais mais completos possuem a função “Enquete”, que permite ao síndico fazer pesquisas de satisfação sistematicamente. Conselho Mas o síndico não deve ser passivo. Tem de ir atrás. Ao primeiro sinal de descontentamento ou da formação de grupos que se manifestem contra sua gestão é importante chamar para o diálogo. “Na conversa direta a gente percebe o teor da crítica. Já cheguei a convidar condôminos descontentes para o Conselho. É curioso ver que, depois de alguns meses, esses novos conselheiros costumam admitir: ‘não sabia que era assim difícil a administração do prédio!’ Isso acaba tendo um efeito didático e calmante.” As novas tecnologias de comunicação, como aplicativos de telefonia, potencializaram a capacidade das panelinhas. “É algo parecido com o que ocorre com as redes sociais. Vieram para o bem e para o mau, mas o mundo passou a ser diferente, mais conectado.” Para o professor do curso de síndicos, tal como ocorre nas empresas o ideal é ter uma comunicação oficial forte e periódica. “Os aplicativos condominiais acabam combatendo aquilo que no passado era chamado de ‘Rádio Peão’, ou seja, fofocas e, eventualmente, intrigas.” Assembleias O melhor lugar para o debate de ideias nos condomínios é mesmo a assembleia, pondera o professor. “Nela, é possível colocar posições de forma clara, debater temas e decidir segundo a vontade da maioria.” Jovino também aposta que o modelo de assembleia condominial a prevalecer daqui em diante será o misto, presencial/virtual. Por último, um recurso preventivo que pode e deve ser usado pelos síndicos para evitar comportamentos predatórios, apregoa o diretor do Centro de Capacitação de Síndicos, é a realização de eventos coletivos, como churrascos, comemorações de datas, como Dia das Crianças, e outros. “Essas festividades permitem a quebra do gelo entre condôminos, inclusive o síndico. Conhecendo-se melhor, num ambiente informal e festivo, a hostilidade e o estranhamento tendem a diminuir.”
Fontes: Condominiossc, Cbmais
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